A terra não é esférica





" Nos idos anos de 2002/3 escrevia umas coisas para o "Praça Pública" a convite do seu diretor. Ontem descobri nos Backups uns esquecidos textos, e confesso que fiquei ... Já não me lembrava nada disto. aqui vai:
( não alterei uma virgula, mas utilizaria um ou outro tempo verbal e mudaria 3 palavras)  


A Terra não é esférica.


Cronista que admiro intermitentemente, (por falta de tempo), Clara Ferreira Alves agradeceu há dias publicamente a Luís Figo e a Cristiano Ronaldo pelo facto, de muito recentemente, lhe terem facilitado a vida nas suas viagens pelo mundo dos extremos, lá para as arábias, presumo. Ora quem tem a mesma nacionalidade e já esteve decerto próximo destes jogadores só pode ser boa pessoa e as dificuldades, os problemas e a morosidade de situações transformavam-se por isso e como que por milagre em simpatias expontâneas e em soluções imediatas para a transposição de pequenas barreiras, cujas dimensões e aferição constitui sério problema para quem viaja por diferentes paragens.
O futebol é um desporto global, de tal modo que até o Sr. Presidente da Federação Portuguesa de Futebol diz (exagerando?), que a FIFA é mais representativa do que a ONU, pois tem mais países inscritos. Mas o que é certo é que o fenómeno mediático, económico e desportivo que é o futebol, vai mantendo a possibilidade de inscrição a nível global de países como Portugal, os Camarões, ou a Costa Rica, permitindo que a identidade desses países ocorra nos sítios mais distantes do planeta, e com isso a cultura, a língua e os claros olhos de Clara passem a pertencer também ao mundo das coisas que nos identificam e nos caracterizam.
E porque é isto importante? Recordo que na minha já longínqua vida de emigrante/ estudante, e sem nunca ter prestado a mínima atenção ao futebol, dava por mim nas tardes de estudo ao Domingo  a ouvir relatos de futebol num aparelho que captava ruidosamente uma experimental rádio portuguesa de New Bedford, na Nova Inglaterra. Naquelas condições e naquele contexto, ouvir português, ou algo parecido, reequilibrava o meu sentido identitário e ajudava-me a estudar e a escrever, em inglês. Para os emigrantes, este aspecto é de uma enorme importância pois o drama da identidade, e dada a nossa deficiente auto-estima, coloca-se num patamar de elevada importância.
As últimas notícias do futebol, não são boas, mas, retirando a queima de bandeiras e cachecóis de clubes, não me surpreendem nem um bocadinho. Os ingredientes que compõem o futebol português são os mesmos que compõem a nossa sociedade. Se queremos saber como funciona a justiça, olhe-se para os orgãos judiciais que compõem os organismos do futebol. Se quisermos saber como funcionam as intermediações, as luvas e as fugas aos impostos, repare-se nos contratos dos jogadores. Se quisermos saber como vamos em matéria laboral, veja-se como contratar um contínuo. Se quisermos saber como agem os nossos dirigentes, observemos os telefonemas que já não servem de prova. Se procurarmos perceber quem responsabilizar, temos que esperar que, novamente, o galo cante, e por aí fora.
Caricaturas à parte, a questão que coloco neste espaço do Praça Pública é como equilibrar em termos educativos toda esta escola de valores, toda esta moral, toda esta enorme força referencial que é o futebol, sabendo nós que estamos diariamente a educar e a criar referencias aos mais jovens. Como vamos descobrir o antídoto, sem passarmos por ingénuos pregadores de valores de uma moral ultrapassada, os “dââ” e os “deff” das novas gerações, gerações estas que estão a ser colocadas em territórios sem regras e sem valores de referência. Pluralismo ou multiculturalidade ?
Não me admira portanto que certos jogadores se tenham dado mal com um tal de Coo Adrianse, e preocupa-me a forma como os nossos engenheiros militares que vão para o Líbano irão (?) ser recebidos. Ouvi dizer que conseguem construir uma ponte de duzentos metros em 30 minutos! AH, Já me ia esquecendo de que em campo conseguimos por vezes belos resultados.

Helder Ventura.




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