Sardinhas e Maias a simbiose perfeita

As grandes sardinhadas,

Aconteciam todos os anos,  sempre no início do Verão estas grandes sardinhadas e aconteciam por iniciativa do Denis, em redor do aniversário da Cristiana, ou numa outra ocasião, já os santos populares iam no adro, ou o S. Pedro se esgueirava de férias, rumo ás vindimas...

Começavam estas sardinhadas por um simples telefonema, “olha, vamos fazer uma sardinhada…” e quantas sardinhas serão necessárias, e quantas pessoas estarão presentes, e quem encomenda as sardinhas, primeiro na peixaria da Rosa, e depois na excelente peixaria da Adriana, que saudades da peixaria da Adriana, quando fechou a peixaria da Adriana terminou a secular relação do furadouro com o peixe… com o Mar.

Sob uma velha ramada de videiras antigas, muito antigas, onde por vezes os melros faziam ninho e cuja ramagem produzia um ambiente mágico de luz e sombra, sob um teto verde luminoso recortado por azul celestial aplicado à espátula , colocava-se a mesa, junto ao poço quase decorativo, que compunha aquele pequeno pátio, onde pontuavam esteios de granito que seguravam a ramada, e onde havia flores em redor, transição para o relvado onde se davam uns chutos numa bola, enquanto ela permanecesse no quintal, antes de sobrevoar a bancada lateral e ir parar ao quintal do dr. Lamy. Intervalo, diziam as crianças,  que lamentavam o desaparecimento da bola entre os dentes do pastor alemão do celebre vizinho e amigo.

Decidido o número de sardinhas necessário, tratava-se de as encomendar, com antecedência, e eram sempre frescas e gordas e excelentes estas sardinhas assim planeadas, assim convidadas elas também para a sardinhada. O Denis fazia tudo com estilo, com aquele estilo que só alguma educação já longínqua e inacessível permitia pelo que organizar uma sardinhada uma simples sardinhada, nunca era tarefa simples. Quem ia buscar as sardinhas, quem tratava do carvão e das brasas, os pimentos, as batatas o pão. E claro, o vinho. O vinho, ou os vinhos, pois aqui chegados, era neste ponto prévio da sardinhada que nos detínhamos  mais tempo. Este ano vamos experimentar um Malbec… para a entrada tenho um branco Neozelandez. Mas o que nos entusiasmava eram as descobertas que fazíamos ali para os lados de Oliveira de Azeméis, o primeiro supermercado Pingo Doce da região, com vinhos que hoje recordamos com saudade e que acompanhavam e muito bem estas grandes sardinhadas e que criaram história. Estão neste lote os famosos Quinta das Mais de 94 (Dão), os pinot noir  e trincadeira preta da Casa Cadaval ( 92, 93,94), os inesgotáveis vinhos de 94 Pegos Claros (Pegões), uma enorme surpresa. Percorremos diversas grandes sardinhadas com estes vinhos, e apartir de certa altura e enquanto foram mantendo a qualidade inicial eram presenças incontornáveis nestes eventos, que permitiam o encontro e reencontro de amigos do Porto, o João e o seu inigualável e intelegentíssimo humor, as histórias da Cristina e a presença aglutinadora mas criteriosa da Cristiana que sempre nos fazia sentir em casa amiga, acolhedora.

No entanto de todos os vinhos que por ali passaram fazendo coro e orquestra com as prateadas e douradas sardinhas, devo realçar o Quinta das Maias de 94, que, com o peixe fumegante os pimentos e a broa se revelava o melhor dentro dos melhores. E acreditem, experimentámos bastantes e bons. Ficou na memória este Quinta das Maias, e sempre que saboreio umas sardinhas assadas surgem lá longe mas bem presentes os impressionistas, aqueles quadros de Seurat nas margens do Sena, uma luz coada de obra verdejante pintalgada de azul, o fumo e o odor das sardinhas, era eu encarregue da grelha, e as sobremesas que se seguiam onde pontuava a “mousse au chocolate” ,agora já com um licoroso ou uma outra aguardente, compõem um colorido de memórias cuja autoria é o vinho deste magnífico ano de 94. São lembranças aos molhos e que  que se repetiram  e que perduraram pelo tempo, depois com outros vinhos de que já não me lembro, talvez uns Rioja e uns Chilenos, mas de quando em vez, lá voltávamos a um Dão, na esperança de que as Maias voltassem, mesmo que em Agosto tardio…

Comentários