Arqueologia

Ando a escrever um texto crítico sobre uma obra de arquitectura. Exercício algo facilitado pelo facto de conhecer aquele recanto onde se implanta, desde há muito.
Um antigo armazém de cereais transformado em refeitório e guinásio...
Através desta reflexão cheguei á matéria, á autenticidade da matéria, que nos relaciona quase de imediato com o "tempo". Deste modo relembrei Michaelangelo Antonioni e através de um amigo, " que está a 2000km de distância," fui parar a umas fotografias de "blow up" filme dos anos anos 60, deste autor... Coincidências que me levam a reordar coisas da minha história, hoje que vamos ter jantar de amigos de liceu, daqueles que se não vêm hà anos...

Mas o filme que me fez relacionar o espaço-tempo com Antonioni foi " Identificação de uma mulher". Aí, nesse filme "denso" surge uma casa rural, ocre, "anichada" num terreno, onde o tempo parece ter parado. Posso contar agora, passado algum tempo, que durante anos acalentei o sonho de possuir um moínho e suas dependências, junto ao caminho de ferro, em Ovar, local onde actualmente funciona o grupo de escuteiros .
Posso também dizer, agora que já passou tanto tempo que muitas vezes perdia combóios a caminho das aulas, porque não resistia a visitar aquele recanto, com aqueles muros de "barro" um portão de ferro vermelho da ferrugem, e um pátio em "U" atravessado pela levada de água ao moínho, tudo coberto por um véu de folhas de videira cujos caules eram mais antigos que as paredes, assim parecia.
O pátio era dividido em 2 pela "levada" e uma laje de ardósia servia de ponte entre os dois espaços. Mas o que me facinava era a escala, tudo muito concentrado, pequenino, mas livre, belo, poético. Como na casa do filme de Antonioni.
Imaginava como recuperar aquele espaço, quase sem tocar, deixando a cozinha, a lareira, o quarto, o forno, e o moínho, as portas com 1,70 de altura, os degraus tortos, mas tudo, tudo no sítio.

Lembei-me de escrever isto, só para dizer ao Jorge que " a poesia diz o que a razão teme", coisa que li ou escrevi em qualquer lado. Talvez á porta do senhor "R", a que fui um dia bater, com a intenção de comprar aquele moínho, apesar de não possuir nem um tostão. Depois, não sei o que aconteceu. Já não me lembro.

Comentários

Anónimo disse…
Grande texto.

Esse moinho também faz parte das minhas memórias de adolescente aventureiro. Estou-te grato por me teres permitido viajar no tempo.

Quanto ao que dizes acerca da poesia e da razão: a escrita, a arte duma maneira geral permitem-nos fugir, não de forma necessariamente irresponsável, aos ditames do espaço-tempo. Trata-se, nos tempos que correm, de um exercício higiénico e vital...

Abraça-me essa malta do liceu...

Jorge
...este vento de mar que não vem do mar estas sílabas molhadas que não da tua língua vêm da terra inchada de temporais...

a poesia é a outra "forma" de dar forma ao indizível mas intuído...ou não?
Bom fim de semana...
Anónimo disse…
Jorge,

o jantar foi interessante. Acabamos em casa da Alice até ás tantas. Não sabia, ela tem uma casa no Furadouro. Aquela toda em granito, virada ao mar. Um belo tema aquela casa toda em granito virada ao mar, e tem mesmo uma história digníssima...E todos nós nos divertimos e contámos histórias, passadas e futuras.

M.F.,

A poesia, os ventos, e a terra molhada, obrigada pelas bonitas alegorias.

Boa semana...
Anónimo disse…
Mas falta falar da intuição, que considero bem real.
Anónimo disse…
Claro que é real. Tem tido é muito "bad press" nos últimos 900 anos. Desde que S. Agostinho entronizou Platao e o discurso da razao como a via para o conhecimento...

Existe um filao subterrâneo que percorre a nossa cultura do último milénio, o dos poetas e pensadores místicos, que, porque incómodos e "heréticos" foram calados e discriminados pela historiografia oficial.

Felizmente os orientais souberam conservar e afinar a intuiçao como "forma de conhecimento" e pôr o intelecto no lugar (é "apenas" uma das nossas ferramentas...).

Pano para mangas...

Abraços,

Jorge
Anónimo disse…
Está muito fixe